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Alvaro Valle
Alvaro Bastos Valle

Patrono
O SONHO QUE PODE VIRAR PESADELO
   
Não foi necessário nem chegar ao limite dos 140 caracteres do twitter. Bastou uma mensagem sete vezes mais curta e telegráfica: http://ofa.bo/bWjHd7. Esta foi a senha em abril passado, exatamente um ano atrás, para anunciar a nova candidatura de Barack Obama à Casa Branca. A campanha de reeleição em 2012 parece ser uma tarefa bem mais difícil do que sua épica eleição em 2008, quando venceu históricos preconceitos de um país que foi à guerra civil em 1860, entre outros motivos, pela cor da pele. Agora, Obama enfrenta um adversário bem mais forte: o próprio Obama e sua mística.

Produto do melting pot racial que construiu os Estados Unidos, natural do Havaí, com pai negro africano, mãe branca norte-americana e padrasto asiático, o líder comunitário e advogado de direitos civis Barack Hussein Obama II estreou na política nacional como senador só em 2004 e, quatro anos depois, elegeu-se presidente aos 47 anos. Uma história improvável para justificar o american dream, que permite que o sonho, contra todas as chances, se torne realidade.

Quando Obama nasceu, na década de 1960, os negros ainda não tinham direito ao voto no sul do país que, um século antes, sangrou com um milhão de vítimas na Guerra Civil entre norte e sul que matou 625 mil e feriu 412 mil americanos.

Quando Obama assumiu a presidência, em 2009, os Estados Unidos estavam no seu sexto ano da Guerra do Iraque. Ao retirar o país da guerra, em dezembro passado, cumprindo promessa de campanha, Obama e os americanos pagaram uma conta pesada: 4.800 mortos e 32 mil feridas na força de ocupação de 112 mil soldados, que custaram aos americanos, em oito anos de conflito, a fortuna de US$ 3 trilhões, 1/5 da riqueza anual do país mais rico do mundo, 20% mais do que todo o PIB do Brasil, a sexta maior economia do planeta.

Os presidentes americanos ganham quando entram em guerra, e perdem quando ela dói no bolso. Aconteceu assim com George W. Bush, que se reelegeu em 2004, vencendo em 31 dos 50 Estados, na crista da reação militar ao ataque terrorista ao World Trade Center, três anos antes, e um ano após a invasão do Iraque. O pesado custo da guerra devastou as contas nacionais, que em outubro de 2008, um mês antes da eleição de Obama, exibiam um rombo de US$ 11, 3 trilhões (mais de quatro vezes o PIB brasileiro), o dobro da dívida americana em 2000, quando Bush foi eleito pela primeira vez.

O front interno continua sendo mais importante, para o americano, do que as aventuras militares no exterior. Obama prometeu o fim da intervenção no Iraque, mas não cumpriu o compromisso de fechar a base americana em Guantánamo em Cuba, um buraco negro legal onde mantém prisioneiros à margem do sistema jurídico internacional. Isso não constrange seus compatriotas tanto quanto a crise econômica, que ainda chicoteia o país após o tsunami de 2008: 40% dos americanos dizem que sua situação financeira piorou nos últimos anos. Existem sinais de uma lenta recuperação dos empregos e dos resultados financeiros das empresas, mas ainda não embalam a campanha de Obama com o vigor de sua primeira eleição.

O fantasma das promessas não cumpridas do primeiro mandato assombra a segunda campanha presidencial de Obama com mais força do que o adversário republicano. A condição de milionário de Mitt Romney não afugenta os eleitores, que suspiram por um presidente mais decidido no comando da economia interna do que hábil na arte da guerra externa. Não basta tirar soldados das trincheiras, é preciso botar dólares nas carteiras.

Dono de uma fortuna pessoal de US$ 250 milhões (metade da riqueza de George Washington, o primeiro presidente, dono de 3 mil hectares na Virgínia), Romney opera um rendoso fundo de investimentos (Bain Capital) que garante a ele e sua mulher uma renda anual de US$ 21 milhões. Boa parte é doada para sua igreja mórmon. Isso lhe garante o apoio da importante ala religiosa de direita que sustenta o voto republicano, órfão desde a passagem do belicoso Bush pela Casa Branca.

Os cristãos evangélicos que antes apoiavam o radical senador Rick Santorum migraram para Romney e alavancaram sua candidatura. Em abril, a seis meses da eleição, pesquisa do The New York Times mostrava um virtual empate - 46% - entre ele e Obama. A popularidade do presidente começou a cair, em meados de 2011, enquanto subia o preço do combustível, inflamando os índices eleitorais com um viés de baixa que parece irresistível num eleitorado que sabe que a questão fundamental da eleição é a economia, estúpido!

A situação de Obama só não é pior porque, em novembro passado, a lenta recuperação de Wall Street registrou uma queda no índice de desemprego - 8,6%, a primeira vez em dois anos que baixa da marca histórica de 9%. Ainda assim, 13 milhões de pessoas (um exército 105 vezes maior do que a tropa de ocupação no Iraque) formam os batalhões de desempregados no país mais rico do mundo, onde a fila dos pobres atingiu em 2010 a cifra recorde de 49 milhões de pessoas, quase 1/6 da população dos Estados Unidos.

Um Congresso de maioria republicana retarda avanços no serviço público de saúde e freia medidas mais liberais de Obama, que encontra dificuldades para conciliar benefícios fiscais para a classe média junto com maior taxação sobre os ricos - como Mitt Romney. Hoje, 400 norte-americanos, milionários como Romney, detêm a mesma quantidade de dinheiro que metade dos habitantes do país (308 milhões, segundo o Censo de 2010).

Nas redes sociais, Obama ainda é um fenômeno arrasador. Tem 26 milhões de seguidores no Facebook, contra 2 milhões de Romney. No Twitter, o democrata arrasta 15 milhões de seguidores e o republicano, apenas 500 mil. No YouTube, o sorriso largo de Obama já teve 180 milhões de visualizações, contra 6 milhões dedicadas ao sorriso plastificado de Romney. Até agora, porém, isso não garante a eleição. O tiro que matou um ano atrás o líder terrorista da Al Qaeda, Osama Bin Laden, deu um fôlego ao presidente: de abril para maio de 2011, a popularidade de Obama subiu de 44% para 56% de aprovação entre os americanos.

Mas a 'bala de prata' que decide eleição, como sempre, será a economia. Nos próximos seis meses, Obama terá a chance de vender ao eleitor americano o american dream que embalou sua inspiradora eleição para o primeiro mandato. Se não convencer, o sonho de Obama poderá se tornar um pesadelo. Essa é a dura rotina da democracia americana.



   
 
 
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