Ronald de Carvalho, Jornalista - Instituto Alvaro Valle
A Suprema Corte, praticamente transformou, pela primeira vez, o perfil de uma campanha eleitoral nos Estados Unidos, que evoluiu de uma simples disputa política, tomando um caráter plebiscitário, com a faixa mais pobre aprovando a medida e os conservadores combatendo-a sob a acusação de ser demagógica e eleitoreira.
A campanha eleitoral nos Estados Unidos acaba de sofrer uma grande reviravolta: a Suprema Corte dos Estados Unidos aprovou, por 5 votos a 4, uma das principais bandeiras de Barack Obama na campanha que o elegeu em 2008 - e de todo o seu mandato.
O tribunal considerou constitucional toda a mudança aprovada em 2010, inclusive a controversa proposta de tornar obrigatório a todos os americanos, exceto aqueles que vivem abaixo da linha da pobreza, adquirir um plano de saúde.
A decisão representa uma vitória para Obama, que tenta se reeleger e aparece tecnicamente empatado com o rival republicano, Mitt Romney.
Tudo indica que a balança pende mais para o lado dos mais pobres. Com a espinha dorsal da lei mantida, os juízes não viram necessidade de derrubar o resto da legislação de 2.000 páginas, que, entre outras coisas, eleva para 26 anos a idade em que jovens podem permanecer cobertos pelo plano de saúde de seus pais.
Por cinco votos a quatro, os nove juízes ampararam o ponto mais polêmico da reforma, o chamado mandato individual, que obriga todo americano a comprar plano de saúde a partir de 2014, se já não o tiver através de seu empregador ou de um dos programas do governo.
Estima-se que 30 milhões de pessoas estão nesta situação. A penalidade pelo descumprimento será uma multa, que os juízes consideraram estar dentro dos poderes do Congresso, fixada com base em suas prerrogativas de estabelecer impostos. O mais surpreendente da medida é que Obama, quando senador, votou contra a indicação de o presidente da Corte, John Roberts, cujo voto foi decisivo.
Quando deu início à campanha por sua reeleição para a presidência, Barak Obama, o candidato democrata ungido na convenção final de Iawoa em 2011, tinha como ficha maior do jogo a morte de Osama Bin Laden, que tinha sido uma promessa de campanha.
Mas era muito pouco, embora consumada, diante das enormes dificuldades econômicas que o país começou a enfrentar, após o estouro da bolha imobiliária, seguido da quebradeira dos maiores bancos. Esses fatos provocaram um crescimento rápido do desemprego e uma situação insustentável da economia, com as dificuldades que se seguiram para a geração de renda, principalmente na faixa dos imigrantes legalizados.
Ao longo dos primeiros meses da campanha, Obama apelou para fatos pontuais, como o apoio à união estável dos homossexuais e as promessas de um plano de saúde beneficiando a faixa mais pobre da população. Mas a maioria dos americanos, apoiada nas informações dos institutos de pesquisa, que apostavam em 80% de rejeição dos juízes, não acreditava na vigência do plano.
A obrigação de contratar um seguro médico, em um país onde 32 milhões não têm ou não podem se permitir o luxo de uma cobertura médica, divide apaixonadamente os Estados Unidos desde a aprovação da Lei da Saúde Acessível (ACA, sigla em inglês) em março de 2010.
A lei cria todo um novo aparato burocrático no sistema sanitário americano. A ACA obriga, além disso, que as companhias de seguro aceitem qualquer pessoa mesmo com problemas de saúde e permite aos jovens serem inscritos como dependentes nas apólices de seguro de seus pais até a idade de 26 anos.
Segundo a Casa Branca, cerca de seis milhões de hispânicos têm acesso agora sem custos adicionais aos serviços de cuidado preventivo e 500.000 mais se beneficiam de programas para aposentados e pessoas maiores de idade. É com estes votos que Obama conta.
Até 2014, cerca de nove milhões de hispânicos poderão obter cobertura de saúde como resultado dos custos menores e dos subsídios.
Tão logo a decisão da Suprema Corte foi divulgada, reações começaram a chegar com e-mails de organizações de esquerda considerando o resultado um "golpe duro" contra o movimento de direita "Tea Party". Grupos conservadores do movimento, vêem na "Obamacare" (um trocadilho pejorativo com o termo "health care", ou cuidados da saúde) uma demonstração clara das tendências "socialistas" do presidente.
O contra ataque do Partido Republicano não se fez esperar: o candidato do partido nas eleições de novembro, Mitt Romney, diz que vai "repelir" a lei no seu primeiro dia de trabalho, se for eleito, que tentará barrar no Congresso.
Ele conta com o apoio da Câmara dos Representantes que votará no dia 11 de julho pela revogação da reforma da saúde do presidente democrata, segundo declarações do influente republicano Eric Cantor, logo depois da decisão da Suprema Corte.
E o próprio presidente da Câmara, o republicano John Boehner, se comprometeu a seguir lutando para revogar a reforma do sistema de saúde.
Entretanto, mesmo que a câmara baixa dominada pelos republicanos desaprove o texto, a revogação não tem chance alguma de passar pelo Senado, que permanece nas mãos dos democratas, nem pelo veto do presidente Obama.