HomeBiblioteca/LivrosDoutrinaVídeo AulasMemória Digital
Alvaro Valle
Alvaro Bastos Valle

Patrono
A ONU E A DURA VIDA DOS REFUGIADOS
   
O Coordenador do Alto Comissariado da ONU para os Refugiados (ACNUR), Panos Moumtzis, divulgou um relatório informando que o número de refugiados sírios nos países vizinhos (Turquia, Líbano, Iraque e Jordânia) pode passar dos atuais 300 mil para 700 mil até o final do ano.

O apoio financeiro e logístico a essas populações, é liderado pelo Escritório das Nações Unidas de Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA), um Fundo que tem possibilitado assistência a pessoas afetadas por desastres naturais e outras crises em cerca de 80 países nos últimos cinco anos.

Trata-se de um dos processos logísticos considerados dos mais complexos e caros do mundo, para dar assistência a quase meio bilhão de pessoas até o final de 2012. E envolve desde tendas de campanha ao fornecimento de alimentação diferenciada, por causa do grande número de crianças e de regras religiosas que proíbem vários tipos de alimentos, passando por um esquema especial de saneamento básico para evitar epidemias, na instalação de muitos milhares de banheiros e sanitários de campanha à eliminação dos lixos de resíduo sólido.

Para cumprir esta extensa agenda a ONU conta com o apoio de milhares de pessoas, ligadas a organismos oficiais e uma centena de ONGs humanitárias, como, por exemplo, os "Médicos sem fronteiras".

Outro organismoque funciona como linha auxiliar da ONU, o Fundo Central de Resposta de Emergência (CERF), desembolsou mais de US$ 2 bilhões em ajuda desde que foi lançado, em 2006, tornando-se a maior fonte mundial de financiamento de ajuda humanitária.

Em 2011, o CERF ajudou aproximadamente 29 milhões de pessoas em 45 países como Haiti, Nigéria, Somália ou Paquistão e 400 milhões de dólares em ajuda humanitária foram distribuídos durante 2011. Isto porque o ano foi marcado por conflitos de grande repercussão internacional, com o advento das revoltas que se convencionou denominar de "Primavera Árabe", uma série de guerras civis deflagradas em países do Oriente Médio,derrubando governos ditatoriais no Egito, Tunísia e Líbia, aos já conhecidos problemas internos da Somália e da Colômbia. Esses conflitos e as perseguições (política, religiosa, sexual, entre outras) forçaram 42,5 milhões de pessoas em todo o mundo a fugir ou se manter longe de suas casas por risco de vida.

Os dados integram o relatório Global Trends 2011 (Tendências Globais, em tradução livre) do ACNUR, e incluem 15,2 milhões de refugiados externos (pessoas que tiveram que cruzar as fronteiras de seus países) - 10,4 milhões sob os cuidados do ACNUR e 4,8 milhões de refugiados palestinos, além de 26,4 milhões de deslocados internos (dentro de suas próprias fronteiras).

"Isso está relacionado com as crises humanitárias, os conflitos velhos e os novos, como a Primavera Árabe. Como os conflitos antigos não se resolvem e há novos, cria-se uma tendência preocupante para os refugiados", diz Andrés Ramirez, representante do ACNUR no Brasil.

Os dados do relatório são preocupantes pois mostram que o acúmulo de conflitos suplantou o trabalho do Acnur. Em 2011, o órgão da ONU conseguiu repatriar voluntariamente 532 mil pessoas, mais que os 197,6 mil de 2010, mas o número é o terceiro pior resultado em uma década. Isso significa que os refugiados estão ficando cada vez mais tempo nos países de asilo.

Em 2011, um grande número de deslocados internos retornou a suas casas (3,2 milhões), mas ainda assim o número de pessoas nesta situação cresceu em 700 mil em relação a 2010. "É complicado para os refugiados retornarem enquanto a situação em seus países de origem continua crítica", diz Ramirez.

Parte importante deste quadro é resultado de um ano em que conflitos políticos e desastres naturais colocaram a África no centro do problema. O conflito de oito meses entre rebeldes do Conselho Nacional de Transição (CNT) e as tropas do ditador MuammarKaddafi, que estava no poder há 42 anos na Líbia, forçaram cerca de 150 mil líbios a deixarem o país, maioria para a Tunísia. Outros 500 mil se tornaram deslocados internos.

Mas após a morte de Kaddafi e a vitória dos rebeldes - armados pelo Ocidente "por questões humanitárias" e apoiados por bombardeios da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), quase todos conseguiram retornar ao país.

Na Tunísia e Egito, que também derrubaram ditadores, não houve intervenção estrangeira e os conflitos tiveram duração curta. Por isso, o número de refugiados e deslocados foi menor. Na comparação com 2010, o Egito tinha 8,5 mil pessoas em situação de deslocamento forçado (o que inclui refugiados, pessoas em situação de refúgio e pedidos de asilo). No ano seguinte foram 10.413 mil. O mesmo vale para a Tunísia: em 2010, 2.731 mil pessoas estavam nesta situação e 3.556 mil em 2011. Os dados sobre a Síria entram no Global Trends 2012, mas um gráfico do relatório atual aponta mais de 25 mil pedidos de asilo vindos do país no ano passado.

Os conflitos antigos e os desastres naturais completam o quadro na África Subsaariana. Nesta parte do continente, mais de 300 mil somalis fugiram para o Quênia, Iêmen e Etiópia devido à maior seca dos últimos 60 anos no Chifre da África - que chegou a colocar o país em estado de fome, e provocou violência e conflitos no sul e no centro do país.

Ao todo, 700 mil somalis deixaram o país nos últimos cinco anos. Na Costa do Marfim, 207 mil pessoas fugiram, a maioria para a Libéria (cerca de 200 mil), após uma onda de violência tomar o país em novembro de 2010. Depois da derrota nas eleições presidenciais para AlassaneOuattara, Laurent Gbagbo, que ocupava o cargo, recusou-se a aceitar a derrota e a deixar o poder. Isso levou a uma guerra entre as tropas de apoio de Gbagbo e Ouattara, apoiado pelo Ocidente. A ONU interveio e levou o presidente eleito ao poder. A partir de abril, mais de 135,2 mil pessoas puderam retornar ao país até o fim do ano.

Enquanto isso, os conflitos ou violações de direitos humanos na Eritreia e Sudão criaram um fluxo de mais de 127,5 mil refugiados, 76,8 mil deles do Sudão do Sul, 30,2 mil da Etiópia. Esses países também registraram alto número de deslocados internos. Líbia, Costa do Marfim, Sudão, Somália e Sudão do Sul somaram mais de 5,6 milhões de pessoas nesta situação.

Para os refugiados, problemas se acumulam. Sem conseguir retornar para casa, procuram soluções duradouras nos países de asilo. Ao menos 900 mil pessoas se naturalizaram nos locais onde foram recebidos na última década. "Como os conflitos continuam e essas pessoas não podem voltar, elas precisam se integrar no país de asilo", diz o representante do ACNUR no Brasil.

Essa busca por soluções permanentes muitas vezes provoca tensões. "Dos 10,4 milhões de refugiados sob cuidado do ACNUR, 75% estão há mais de cinco anos em asilo. Por isso, os países fazem um grande esforço para tentar ajudar esse público a se inserir como beneficiários das políticas públicas locais", explica.

Ramirez usa como exemplo o Iraque, onde a guerra começou em 2003 e os EUA deixaram o país em 2011. Os conflitos entre xiitas e sunitas, diz, continuam e não há como dizer que vão terminar. O relatório do ACNUR diz que ainda há muitos refugiados iraquianos.

A prática de conceder asilo em terras estrangeiras a pessoas que estão fugindo de perseguição é uma das características mais antigas da civilização. Referências a essa prática foram encontradas em textos escritos há 3.500 anos, durante o florescimento dos antigos grandes impérios do Oriente Médio, como o Hitita, Babilônico, Assírio e Egípcio antigo.

Mais de três milênios depois, a proteção de refugiados foi estabelecida como missão principal da agência de refugiados da ONU, que foi constituída para assistir, entre outros, os refugiados que esperavam para retornar aos seus países de origem no final da II Guerra Mundial.

A Convenção de Refugiados de 1951, que estabeleceu o ACNUR, determina que um refugiado seja alguém que "temendo ser perseguida por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas, se encontra fora do país de sua nacionalidade e que não pode ou, em virtude desse temor, não quer valer-se da proteção desse país".

Desde então, o ACNUR tem oferecido proteção e assistência para dezenas de milhões de refugiados, encontrando soluções duradouras para muitos deles. Os padrões da migração se tornaram cada vez mais complexos nos tempos modernos, envolvendo não apenas refugiados, mas também milhões de migrantes econômicos. Mas refugiados e migrantes, mesmo que viajem da mesma forma com frequência, são fundamentalmente distintos, e por esta razão são tratados de maneira muito diferente perante o direito internacional moderno.

O ACNUR diz que migrantes, especialmente migrantes econômicos, decidem deslocar-se para melhorar as perspectivas para si mesmos e para suas famílias. Já os refugiados necessitam deslocar-se para salvar suas vidas ou preservar sua liberdade. Eles não possuem proteção de seu próprio Estado e de fato muitas vezes é seu próprio governo que ameaça persegui-los. Se outros países não os aceitarem em seus territórios, e não os auxiliarem uma vez acolhidos, poderão estar condenando estas pessoas à morte ou a uma vida insuportável nas sombras, sem sustento e sem direitos.





   
 
 
© - 2009 www.fundacaoalvarovalle.org.br - Todos os direitos reservados
Tel.: - (61) 32029922