Ronald de Carvalho, Jornalista - Instituto Alvaro Valle
O líder do Partiya Karkerên Kurdistan (PKK), ou Partido dos Trabalhadores do Curdistão, Abdullah Ocalan, na mensagem lida para milhares de pessoas por um parlamentar curdo, durante as comemorações do Ano Novo, o Newroz,, na cidade de Diyarbakir, propôs uma trégua com o governo da Turquia, pondo fim a um conflito que já dura quase 30 anos e matou mais de 45 mil combatentes e civis.
O líder, que cumpre prisão perpétua numa ilha, pediu que seus partidários abandonassem a luta armada e concentrem-se no embate político, declarando: "Entramos em uma etapa em que as armas devem se calar". O líder pediu que separatistas abandonassem a luta armada, saindo do território turco. O ministro do Interior, Muamer Güler, comemorou o anúncio, declarando: "Ele utiliza a linguagem da paz, mas temos de ver isso na prática". Segundo um assessor do gabinete do Primeiro Ministro Recep Tayyip Erdogan, "este é um momento histórico para o país, que pode significar o fim do conflito entre o Estado e esta organização considerada terrorista".
O Curdistão não é um país, mas uma região que fica no Oriente Médio, habitado por uma etnia. Os curdos, em sua maioria são muçulmanos sunitas, ocupam um território de cerca de 500 mil quilômetros quadrados, entre a Turquia, o Irã, o Iraque e a Síria. Sua população é estimada, segundo fontes turcas e curdas, entre 25 milhões e 35 milhões de habitantes, dos quais 12 a 15 milhões vivem na Turquia, cerca de 5 milhões no Irã, 4,5 milhões no Iraque e dois milhões na Síria. Também há importantes comunidades curdas no Azerbaijão, Armênia, Líbano e na Europa, principalmente na Alemanha e, mais recentemente, nos Estados Unidos.
De acordo com o cientista político russo Vladimir Minorsky, "não há dúvidas que o termo mar (medos) se refere aos curdos". Além disso, ele diz que "num raro manuscrito armênio contendo amostras de alfabetos e línguas, escrito em algum momento antes de 1446, uma oração curda aparece como exemplo da língua dos medos". Hoje, os curdos formam uma entidade autônoma na região norte do Iraque, o mais perto de um Estado que conseguiram. No Irã, ajudaram a derrubar a ditadura do xá Reza Pahlevi, mas acabaram tendo sua causa separatista boicotada, já que o aiatolá Ruhollah Khomeini, que ascendeu ao poder, foi contra a esta tentativa. Ainda hoje, há muito preconceito contra os curdos, especialmente porque eles são sunitas, e não xiitas, como a maior parte do povo iraniano.
O pedido de cessar as hostilidades põe fim a vários meses de negociações secretas entre os serviços de inteligência turcos e Ocalan. Desde a fundação do PKK em 1984, o líder curso já havia apelado à paz quatro vezes, mas estas iniciativas foram rejeitadas pelo governo de Ancara ou torpedeadas pelos setores mais radicais dos separatistas. Segundo informações dos dois lados no plano de paz o governo turco exigiu que os cerca de 2.000 combatentes do PKK abandonem a Turquia antes do outono, comprometendo-se em fornecer salvo-condutos para que permaneçam no Iraque. Os contatos foram iniciados no ano passado, depois de um aumento do número de atentados contra as forças de segurança. Ocalan afirmou que seu objetivo, com este acordo é a "democratização de toda a Turquia".
O cessar das hostilidades deve levar a uma ampliação dos direitos constitucionais dos curdos e à libertação de milhares de pessoas detidas por seus vínculos com o PKK, uma organização catalogada como terrorista por Ancara e seus aliados ocidentais. Ocalan deve convocar a formação de comissões que garantam a passagem dos combatentes do PKK para o Iraque sem incidentes. Como sinal de boa vontade, o PKK libertou na semana passada oito reféns turcos capturados há dois anos. Desde a chegada de Erdogan ao poder em 2002, a minoria curda obteve maior reconhecimento cultural e linguístico.