Ronald de Carvalho, Jornalista - Instituto Alvaro Valle
A espionagem na opinião dos estudiosos é a segunda profissão mais antiga do mundo, depois da primeira, sobejamente conhecida. Segundo o pesquisador Roberto Navarro na Antiguidade, de acordo com a Bíblia, Moisés foi orientado por Deus a enviar 12 agentes para espionar seus inimigos em Canaã, a terra prometida dos judeus. E há 25 séculos o general chinês Sun Tzu escreveu (no século IV a.C.) sobre o uso de espiões no capítulo 13 do livro "A arte da Guerra", que, segundo seu biógrafo Reginaldo Minarécontinua e continuará "um grande manual pedagógico".
Para Roberto Navarro a profissionalização aconteceu pra valer a partir do século 15, quando vários países europeus formaram organizações para obter informações no exterior, infiltrar-se em grupos dissidentes e proteger segredos nacionais. E ele explica: "No século 20, nações como União Soviética, Alemanha e Japão criaram agências nacionais de inteligência, nome dado aos órgãos que funcionam com amparo legal. Nos Estados Unidos, a primeira foi a OSS (sigla em inglês para Escritório de Serviços Estratégicos), criada durante a Segunda Guerra Mundial. Em 1947, após o fim da guerra, a OSS foi rebatizada como CIA (Agência Central de Inteligência), que dividiu com a soviética KGB (Comitê de Segurança do Estado) a responsabilidade pelos principais casos de espionagem durante a Guerra Fria. No fim da década de 1980, com o fim das tensões entre as duas superpotências, muitos agentes passaram a trabalhar nos bastidores de grandes operações industriais e comerciais".
A espionagem, ao longo da história, tem gerado focos de grandes tensões internacionais. Atualmente os Estados Unidos estão novamente no olho de um verdadeiro furacão da mídia internacional, acusados de ter criado uma rede sofisticadíssima de espionagem cibernética que controla governos e cidadãos do mundo inteiro, com destaque para o Brasil (que promete uma denúncia na ONU), através de parceria com grandes redes que integram a Internet, coletando informações não só de seus nacionais, mas também de estrangeiros.
Sobre a discussão o analista Fernando Peres indaga: "Até que ponto a espionagem cibernética dos Estados Unidos é uma surpresa? Acredito que mais do que um momento para um pânico diplomático, a conscientização sobre o uso correto e seguro da Internet pelos usuários é mais importante ainda. Estamos expondo a nossa privacidade de tal forma que perdemos o controle sobre essas informações. Obviamente nenhum de nós quer ter o direito à privacidade atingido, mas devemos atentar que muitas vezes não precisamos de alta tecnologia para nos espionar, pois nós mesmos divulgamos as informações abertamente nas redes sociais e de bate -papos que freqüentamos".
Segundo Peres essas notícias não deveriam causar grande espanto, pois isso já vinha ocorrendo há muitos anos. E ele explica: "Em diversos depoimentos oficiais do governo, os americanos já admitiam que realizavam o monitoramento de ligações telefônicas e trocas de dados de mensagens na Internet O que acontece agora, é que com a exposição dos documentos sigilosos da Agência Segurança Nacional dos EUA (NSA) tudo se torna mais explícito e exposto. Assim como quando o Wikileaks revelou documentos secretos de vários governos, naquele momento já se demonstrava que o governo americano ainda mantinha uma grande atividade de espionagem, inclusive no Brasil.
O mesmo ocorre agora com o ex-agente terceirizado da Cia, Edward Snowden que, segundo o jornalista Glenn Greenwald, tem em seu poder informação suficiente para causar mais danos ao Governo norte-americano num minuto do que qualquer outra pessoa na História dos Estados Unidos."
E Peres prossegue: "Engana-se quem pensa que com o fim da Guerra Fria, as atividades de espionagem acabaram. A principal diferença é que se tornou mais técnica do que pessoal, pois com o constante avanço da tecnologia cada vez mais a troca de informações se realiza pela Internet. Desse modo, o número de informações trafegando entre governos e as demais pessoas aumentaram de forma exponencial".
Diante de todas essas evidências Peres é de opinião que as notícias sobre as espionagens cibernéticas dos americanos não deveriam ser uma surpresa. A maioria das informações circula pela Internet. Praticamente toda a comunicação atualmente é realizada através do envio de dados, mesmo as ligações telefônicas. Além do mais o número de informações transitando na rede chega a ser imensurável. Para ele, as atividades de espionagem nunca deixaram de existir ao longo da história. Somente os métodos e tecnologias empregadas mudaram. E ele prossegue: "Com a devida colaboração (ou não) é possível interceptar uma grande quantidade de dados. Muitos desses transitam pelos Estados Unidos, ficando assim mais fácil de interceptar. A Guerra Cibernética já é uma realidade. Muitas batalhas já foram travadas no ciberespaço, que hoje é considerado o quinto campo de combate, além da terra, mar, ar e espaço. Se vasculharmos por notícias mais antigas, teremos muitos casos em que o governo americano já havia sido acusado de espionagem cibernética".
Ao longo da história várias mulheres se destacaram no campo da espionagem. A primeira mais famosa foi Brita Tot, filha de uma nobre família dinamarquesa que em 1442 casou-se com um integrante da família real sueca. Dez anos depois, os suecos tiveram um enfrentamento com os dinamarqueses. Durante essa época, Brita converteu-se na espiã perfeita para sua terra natal e transformou-se em cúmplice da conspiração para matar o rei sueco Carlos VIII. Quando o rei se deu conta da traição, foi declarada culpada e condenada à fogueira. O castigo foi trocado por um outro que consistia em ser enterrada viva em uma parede. Mas finalmente permitiram que vivesse até o final de seus dias em sua terra natal.
Mata Hari, foi a mais famosa de todas. Nascida em uma família holandesa endinheirada, Margaretha Geertruida Zelle chegou a Paris recém-divorciada, converteu-se em Mata Hari, que em malaio significa olho de cisne, uma das nudistas mais reconhecidas do momento. Viajou por vários países e converteu-se na cortesã de alguns dos homens mais ricos do governo e do exército. Quando explodiu a Primeira Guerra Mundial, os franceses a consideraram suspeita de espionagem para os alemães, apesar de que tinha trabalhado para eles. Ainda que tenha assegurado ser leal a França, foi presa em 1917 executada oito meses depois por seus próprios chefes.
Os analistas, entretanto são unânimes em afirmar que um espião famoso não é, necessariamente, um dos melhores na sua profissão. E, muitas vezes, nem merecem este designativo. E citam como exemplo o último vazaments que deu origem ao processo que ficou conhecideo comoWikiLeaks, para o qual o Pentágono suspeita ser responsável pela fuga das informações o soldado Bradley Manning, sem antecedentes como espião. O site, administrado por The Sunshine Press, foi lançado em dezembro de 2006 e, em meados de novembro de 2007, já continha 1,2 milhão de documentos. Seu principal editor e porta-voz é o australiano Julian Assange,, hoje asilado político e com extradição pedida pela Austrália. Os analistas dizem que, como um dos segredos dessa profissão é não ser descoberto, os verdadeiros reis da espionagem são aqueles que permanecem no anonimato.
Sir Francis Walsingham após Elizabeth I assumir o trono da Inglaterra, em 1578 organizou o primeiro serviço secreto capaz de obter informações sobre governos estrangeiros em um período de grande rivalidade entre as principais potências européias, como Espanha, França e Inglaterra, dando início à era da espionagem profissional, no século 16. Para tanto criou uma organização que desenvolveu, entre outros truques, códigos e instrumentos para enviar e decifrar mensagens secretas.
Hoje, possivelmente devido ao desgaste da palavra espionagem, que remete à obtenção de informações de forma ilegal, ou pelo fato da expressão "serviço de Inteligência" poder ter melhor apelo de marketing na mídia, as agências de espionagem não se declaram como tal e sim como serviços de inteligência ou de informações. Entretanto, nessas agências sempre são mantidos um departamento responsável pela contra-espionagem. A palavra contra-espionagem, possivelmente por estar ligada à segurança doméstica, indicando ações no sentido de impedir a atuação de espiões adversários, não apresenta desgaste e é sempre utilizada.
Ao longo da história a atividade de espionagem foi promovida, principalmente, pelos Estados, com o objetivo de obter informações políticas ou militares e utilizá-las na formulação de estratégias de defesa ou ataque. Atualmente, muitos Estados também têm lançado mão dos serviços de espionagem para inibir atividades terroristas e desarticular grupos organizados que se dedicam ao tráfico de drogas. Entretanto, cada vez mais os serviços de espionagem e contra-espionagem são utilizados pela iniciativa privada e encontra campo fértil na área industrial e no universo político doméstico.