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Alvaro Valle
Alvaro Bastos Valle

Patrono
A POLÍTICA PÚBLICA PARA O SONHO DE UMA INFÂNCIA FELIZ
   
Valentina era uma menina encantada com os passarinhos.

Aquela fascinação acontecia desde as primeiras cenas que o seus olhos de bebê passaram a registrar a existência daquelas pessoas que voavam.

Todas as manhãs, eram gargalhadas provocadas pelo movimento dos pardais, na janela mais próxima do berço daquele bebê rosado.

Uma janela sem simetria. Um berço improvisado em latão de margarina.

Até este ponto do artigo, poderíamos estar falando da vida de qualquer menina rica ou de classe média. Mas o latão de margarina faz a diferença para a percepção dos mortais, análogos e realistas. Mas para aquela menina, naquela fase, assim como para as suas contemporâneas, tudo era mais ou menos igual, até o desmame no peito da mãe. Graças ao poder infinito da natureza.

Nossa Valentina tinha móbiles naturais em seu berço. Era como se houvesse passarinhos pendurados sobre seu berço....

Pássaros que cantavam ou apenas ciscavam percebiam a inocência de Valentina e se aproximavam quando não havia adultos por perto. Ela se alegrava e pensava que aqueles pardais famintos dançavam para ela.

Havia um gosto especial daquela menina pelos animais de penas que cruzavam o horizonte de sua janela.

Mas a devoção de Valentina pelos pardais não era uma exceção naquela família. Um tio querido, que morava no interior, também era apaixonado por passarinhos. Era o Tio Pedro.

Valentina, desde criança, não por acaso, adorava quando aquele tio de cabelos brancos vinha ao Rio de Janeiro e a visitava. O tio Pedro, na ausência dos legítimos avós, que morreram antes de Valentina nascer, funcionava como dublê de vovô...

E o papel de avô postiço funcionava bem porque a mãe de Valentina era a caçula temporona, de uma família numerosa.

O tio Pedro era o irmão mais velho de um total de 5. Quase 24 anos mais velho que a Juliana, mãe da Valentina.

Sempre que o tio Pedro estava hospedado na casa de Valentina, ele contava histórias sobre passarinhos. Valentina, beirando os primeiros 10 aninhos de vida, ficava encantada com o conhecimento do tio sobre o canto dos pássaros, que ele identificava e imitava. Cantava uma sabiá, tio Pedro logo identificava. Canto de canário? Lá estava o tio pra antecipar a identificações da espécie.... Quando o bicho ficava visível, sempre vinha a confirmação.

O tempo passava e Valentina embarcava em sonhos embalados pela histórias do tio Pedro sobre os pássaros.

Tio Pedro contava episódios fantásticos e interessantes, como os casos em que o poderoso Gavião é obrigado a fugir de pequeninos passarinhos. Nesta caso o bem-te-vi, que, mesmo pequenino, é um tormento na vida do temido Gavião.

Eram muitas histórias. Algumas ricas em lições sobre a vida. Mas as histórias que mais encantavam Valentina eram aquelas extraídas dos "causos" narrados nos encontros de "passarinheiros".

Quando o tio Pedro começava falando que ouviu uma história num encontro de passarinheiros em tal lugar, no ano de mil novecentos e alguma data, Valentina logo se acomodava sentada onde havia disponibilidade. Atentamente, sem piscar, Valentina ouvia com a determinação de quem decoraria cada detalhe da história.

Sua confessada devoção por todas aquelas histórias era tão grande que ela escrevia as suas prediletas num diário que ganhou de sua madrinha.

No ano em que Valentina ia completar 10 anos dia 16 de outubro, seus pais, que eram ricos, pediram para ela escolher um presente especial para o décimo aniversário.

Valentina tinha tudo que queria. Entre os seus bens mais preciosos destacavam-se sua coleção livros, CDs e DVDs sobre pássaros, e as réplicas e miniaturas penduradas no teto. Espalhado pelo quarto havia bonecos e fotos de aves de rapina, araras, aves exóticas e até tinha um pavão em tamanho natural. Incrivelmente parecido com um pavão de verdade.

A cada aniversário Valentina ganhava um pássaro em alguma variação... Não tinha mais como Valentina pedir nada relacionado a pássaros. Não existia mais nada e seu quarto já estava lotado.

Mas quando os pais de Valentina perguntaram, a resposta estava na ponta da língua: Valentina queria conhecer um encontro de passarinheiros. Este era o presente especial!

Valentina é uma menina ficção, amparada numa sua realidade. A maior parte das meninas contemporâneas de Valentina nasceram em condições semelhantes. Mas não gozariam de destino com tanta poesia. Mas antes que alguém suponha que a falta de dinheiro levou estar meninas outras a um destino vil, cabe a correção que justifica este artigo.

Valentina teve amor e o zelo de um ambiente familiar, ainda que inconveniente. Uma salvaguarda bem diferente das suas contemporâneas que terminarão seus dias com memórias apodrecidas no crime e na prostituição.

Enquanto houver o desinteresse dos governos pela preservação da organização familiar, muitos destinos serão perdidos.



   
 
 
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